segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

A mão de Obama


Por ser tão recorrente, não me espanta mais a idiotia - travestida de comentários sarcásticos e pretensamente inteligentes -, cometida por jornalistas e não-jornalistas, especialmente no que se refere às tiradas que demonstram um preconceito igualmente insano e arcaico.

Também não me chamam mais tanta atenção - pela recorrência e cansaço - os paradoxos entre uma página e outra da Veja (para os leitores d'além mar, uma tradução: é a revista semanal brasileira de maior circulação e influência).

E, convenhamos, falar mal da revista até já está démodé. Mas não consegui deixar de vir ao teclado ao ler a edição desta semana (os próximos links são para assinantes, infelizmente).

Enquanto, em sua coluna, Diogo Mainardi conta com ojeriza como se deparou com uma horda de pessoas "porcas, feias e de pernas curtas" à saída de um show no Rio de Janeiro, Pompeu de Toledo explana - magistralmente, como sempre - as razões pelas quais acredita que o mundo não será mais o mesmo, caso, pela primeira vez na História, a uma mão negra recaiam as decisões mais importantes do globo (sobre a possível vitória de Barack Obama à presidência dos EUA).

Na mesma coluna, Pompeu de Toledo usa de metáforas tão geniais que me fazem ir à frente do espelho e lamentar minha parca literatura. Ao comentar sobre a dimensão do vulto de Fidel Castro, maior mesmo do que a mítica que envolve a própria Cuba, ele o compara a um "adulto corpulento numa banheirinha de criança" (a banheira como sendo a ilha, naturalmente).

Confesso que gostaria de ser, quando crescer, uma versão de saias do ensaísta. Mas, como possuo pernas curtas (e não tenho problema algum em tê-las, ao contrário de Mainardi), acho bem difícil conseguir chegar lá.

Abaixo, o trecho final do ensaio:

Roberto Pompeu de Toledo - Revista Veja, Edição 2049, 27 de fevereiro de 2008

O tamanho de Fidel, a pele de Obama…

Uma das atitudes racistas mais canalhas é a do branco que, numa disputa com o negro, aponta no próprio braço a cor da pele, para dizer como sua cor é superior à do outro. Um jogador de futebol fez isso, não faz muito, numa partida no Rio Grande do Sul. Essa pessoa que se sente tão superior porque tem a mão branca terá de aprender a viver num mundo (desconcertante, para ela) em que uma mão preta é que assina as ordens que farão a diferença entre a paz e a guerra, o progresso e a crise, ao redor do planeta, além de ter ao seu alcance os botões nucleares. A cara preta de Obama é que aparecerá todo dia nos vídeos do mundo inteiro. O cabelo duro de Obama e os lábios grossos de Obama é que dominarão a cena. A figura negra de Michelle, a mulher de Obama, é que estará a seu lado, nas recepções na Casa Branca e nas visitas a outros países. Isso fará uma enorme diferença no mundo. Fará uma enorme diferença no Brasil.

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