quarta-feira, 30 de abril de 2008

Somos todos machistas


Ronaldo Fenômeno num motel com travestis. É notícia? Acho que sim. Flagar o mesmo Ronaldo numa delegacia, após confusão com os mesmos travestis, tem apelo noticioso? Não sejamos hipócritas, é claro que sim, ainda mais. O cara é conhecido no mundo todo, ídolo do futebol, carreira meteórica etecetera e tal.

Poderia até discutir a relevância dessa informação, mas seria infrutífero. Todos os argumentos que eu pudesse usar cairiam n'água ante o grande apelo que o fato, por si mesmo, teria de um jeito ou de outro. Se fruto da insaciável curiosidade humana ou da atração irreversível e irresistível que ídolos, mitos, criações midiáticas e afins suscitam nas pessoas, a verdade é que não há quem ignore por completo uma notícia desse naipe.

Assim posto, chego ao ponto-chave da minha argumentação: a cobertura jornalística desse caso tomaria um rumo diferente caso o jogador houvesse se envolvido em confusão semelhante, mas com prostitutas? De todo jeito, o fato seria imensamente explorado, como está sendo agora. Isso não se discute. Mas observemos pela ótica do mito do 'macho'.

Não foram poucas as vezes que Ronaldo povoou a imprensa com fotos ao lado de modelos, namoradas, casos, cachos e one-night-stands. Os textos que acompanhavam as imagens, apesar do tom crítico e por vezes moralista, acabavam corroborando com a lógica do 'homem de carne e osso'. Algo como "o rapaz é rico e dono do próprio nariz, deixa ele se divertir com a mulherada". Supostos flagras de traições protagonizadas pelo craque foram inúmeras vezes noticiadas, e o discurso oculto era quase sempre o mesmo. "Safado, cabra-macho, garanhão!" era o que saltava aos olhos.

Agora acredito que o discurso adotado tenha, sim, tomado outro rumo. A própria resposta do jogador é sintomática: "eu me enganei, achava que se tratava de mulheres". Ah, então melhorou. Porque se antes ele não precisava se 'defender', pois as 'acusações' lhe eram leves, ressaltando sua imagem de 'pegador', agora a situação é diversa. A acusação é grave. Isulta a macheza. Duvida da sua masculinidade, como diriam os cassetas. Opinião semelhante à minha tem o deputado italiano Vladimir Luxuria (não conheço sua plataforma política, mas a alcunha tem lá a sua criatividade), que é transsexual.

O fato de um ídolo futebolístico se envolver numa confusão, de caráter sexual, com travestis, teria a mesma relevância (ou falta de) de um imbróglio aos mesmos moldes, só que com mulheres. Estou errada?

Engraçado é que pouco se falou sobre o suposto uso de drogas no qual Ronaldo estaria envolvido. As matérias se centram mais no escândalo, na 'vergonha' de ter se metido com travestis, a 'mancha' na biografia do jogador. Sobre o consumo de drogas, se é que houve mesmo, o jogador, por ser atleta, deveria mesmo se pronunciar.
Mas e sobre a noitada? Justificativas, quando muito, ele teria que dar apenas à noiva, coitada. Ao resto do mundo, Ronaldo não deve nada. Mas daí a conseguir convencer o mundo disso, são outros quinhentos.

sábado, 26 de abril de 2008


O Grupo de Pesquisa Jornalismo e Contemporaneidade, do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da UFPE, promove, em 28 de maio (quarta-feira), o I Seminário de Jornalismo Contemporâneo, no mini-auditório do Centro de Artes e Comunicação da instituição.

O evento, que contará com a participação de pesquisadores das universidades federais de Sergipe, Paraíba e Pernambuco, tratará de temas como jornalismo e cotidiano, novas tecnologias, objetividade e pesquisa/metodologia.

As inscrições, gratuitas, serão realizadas de 06 a 20 de maio, na secretaria do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da UFPE. Vagas limitadas. Informações: (81) 2126.8960 ou pelo e-mail jornalismocontemporaneo@grupos.com.br

Programação
28/05/2008

Manhã - das 9h às 12h

Estudos, Teorias e Metodologias do Jornalismo
Mediador: Prof. Dr. Alfredo Vizeu, vice-coordenador PPGCOM UFPE
Prof. Dr. Carlos Franciscato, Departamento de Comunicação UFSE, presidente da SBPJor: Prof.

Jornalismo e Objetividade
Dr. Josenildo Guerra, Departamento de Comunicação UFSE:

Tarde - das 14 às 17h

Jornalismo e Cotidiano
Prof. Dr. Wellington Pereira, vice-coordenador PPGCOM da UFPB e professor do Programa de Pós-Graduação em Sociologia

Jornalismo e Novas Tecnologias
Prof. Dr. Afonso Jr, Programa de Pós-Graduação em Comunicação/UFPE

Local: mini-auditório do CAC - UFPE, Recife
Promoção: PPGCOM/UFPE

segunda-feira, 21 de abril de 2008

A estúpida 'obrigação' de ser voz dissonante

Jornalismo-Geni: "Ela é boa de apanhar, ela é boa de cuspir!"


Não sou pelega. Não olho o mundo pelas lentes patronais. Politicamente, continuo insistindo a andar 'às esquerdas' do caminho. Procuro assumir uma postura bastante crítica em relação ao meu objeto de estudo. Por vezes, excessivamente até.

E sempre foi assim, desde que o meu mundo é mundo, muito antes do "tempo de eu menina" (como diria Manuel Bandeira), em que me vi entrevistando trabalhadores no alto de um prédio em construção e descobrindo que, sim, o ofício de repórter havia me fisgado para sempre.

Contudo, o fato de ser drummondianamente gauche na vida não deveria me obrigar a ver tudo com os olhos turvos do enfado. Do descontentamento. Da crítica raivosa e indiscriminada.

Digo isso porque percebo, vez por outra, olharares de desaprovação quando encontro exemplos de bom jornalismo. Quando enxergo além do horizonte determinista. Quando me recuso a apontar um plano maquiavélico da 'mídia e do sistema' como raiz de tudo o que sai, ou deixa de sair, na imprensa.

Naturalmente, na maior parte das vezes - até por necessidade metodológica - eu encontro as manchas, coloco o dedo na ferida, observo, reclamo e discuto os (des)caminhos da profissão. O que eu quero dizer é que, para ter um olhar crítico, não se precisa necessariamente perder o bom senso. Há que se reconhecer o erro. Mas também os acertos.

Sendo assim, gostaria de reivindicar o meu direito de não precisar me regozijar ante desvios jornalísticos. De encontrar e comentar belas peças noticiosas. De não defender que o jornalista é apenas um artífice do 'capital'. De não precisar ser maniqueísta, ora bolas!

De achar que é possível encontrar um entremeio, um lugar em que se dá para realizar, de vez em quando, uma reportagem legítima. Mesmo convivendo com as muitas limitações de uma empresa jornalística, com sanções, censura e constrangimentos. É difícil, muito difícil. Mas não impossível.

Ao menos, concedam-me o direito universal de acreditar!

terça-feira, 15 de abril de 2008

Eu me amo

"É porque Narciso acha feio o que não é espelho"


Resultados (parciais) de uma pesquisa que estou apenas começando: os jornalistas têm uma visão positiva acerca de si mesmos. Nas auto-representações da classe, há mais qualidades do que defeitos a serem ressaltados.

De acordo com recorrências de características que encontrei em matérias veiculadas sobre jornalistas (ou seja, quando o jornalista era a própria notícia), o processo de construção dessa auto-representação descreve o profissional da notícia como:

"Um importante ator social, que exerce o seu grande volume de trabalho numa rotina cansativa, com muito acesso às esferas de poder, e que conta para vencer os obstáculos (censura, pressão dos patrões) com uma boa dose de coragem, ousadia e espírito crítico, além de competência no que faz. Além disso, tem o privilégio de ser testemunha do seu tempo e da História".

Em suma: nóis sofre, mas nóis goza.

quarta-feira, 9 de abril de 2008

fly me to the moon...

... and let me play among the stars


Com o tempo a me fugir das mãos e a cabeça a mil, ando muitíssimo relapsa com este espaço. Semana que vem melhora.

Enquanto coloco minha vida de volta aos eixos, não poderia deixar de registrar o meu pesar pela situação que levou à saída do (agora ex) ombudsman da Folha de S.Paulo, Mário Magalhães.

O motivo - o fato de o jornalista não concordar com a decisão da diretoria em restringir as críticas internas da coluna ao público interno do jornal, sem que os leitores tivessem mais acesso ao trabalho diário de monitoramento - me chocou.

'Tá tudo explicadinho na coluna de despedida (aqui reproduzida pelo Observatório da Imprensa). Em tempo: é a mesma Folha que, no Brasil, lançou e defendeu a bandeira do 'ouvidor' dos leitores nos jornais. Tristeza, tristeza, tristeza. Volto em breve.



Saiba mais neste artigo do OI.

sexta-feira, 4 de abril de 2008

De jornalistas e marceneiros


Um colega de doutorado comentava outro dia: o espaço da apuração criteriosa está tão escasso n'alguns jornais, que vez por outra somos surpreendidos com veículos que resolvem alardear sua característica de 'investigativo', como se todo jornalismo não o devesse assim ser. Parafraseando Marcelo Soares, do E Você com Isso?, é como se um marceneiro resolvesse fazer um anúncio informando que entende de madeira.

Exemplo citado pelo amigo doutorando para ilustrar o comentário foi o Diário do Nordeste, que conta com uma Editoria de Reportagem. O que dizer, então, dos outros cadernos? A reportagem está restrita apenas a esse setor?

Como não conheço bem a imprensa do belo Ceará (com exceção da seção Ombudsman d'O Povo, a qual sempre acompanho), convido os colegas cearenses ou conhecedores do mercado de lá para me esclarecerem essa questão.

quarta-feira, 2 de abril de 2008

Sobre ecochatices, desassossegos e outras artes

F.Pessoa, o mais ilustre dos desassossegados



De início, uma declaração ao estilo Neruda: confesso que sou uma ecochata. Em segundo lugar, um esclarecimento: este post não tem ligação (direta) com a minha pesquisa de doutorado. A mudança de tema, só por hoje, pode ser fruto de uma gripe arrasadora, que está desarrumando minhas já caóticas reflexões sobre o periodismo e me deixando, também, impaciente com atos de incivilidade que venho encontrando em minhas andanças universitárias. Mais do que impaciência. É desassossego mesmo.

Desde que retornei à Universidade, tomei como 'hobby' observar a fauna humana acadêmica. Dez anos após a minha graduação, passei a analisar as diferenças e semelhanças entre a estudantada de hoje e a de uma década atrás. Para facilitar os que não são lá muito versados em contas: tenho 32 anos.

Para minha surpresa, a primeira constatação: com exceção de novos artefatos e penduricalhos - Ipods, laptops e congêneres -, nada de novo no front. Mesmo ar de enfado para com o mundo (o que não deixa de ter o seu charme e encanto), a mesma predisposição em questionar, não importando o quê, a vontade ensandecida de 'crescer' e fazer tudo diferente.

Num ponto, apenas, reside - no meu entender -, o grande 'cisma' entre minha geração do Centro de Artes e Comunicação (CAC) e a atual. Por incrível que pareça, parte da gurizada acha tediosa e aborrecida a bandeira do ecologicamente correto. Vide a quantidade colossal de plástico e outras porqueiras que a meninada espalha pelas lixeiras, pisos e outros espaços do centro, e o absurdo descaso com o gasto de água nos banheiros.

Hoje estive a um passo de surtar. Ao entrar no banheiro feminino do térreo do CAC, uma moçoila conversava, animadamente, enquanto a pia que ela havia acabado de usar para escovar os dentes transbordava. A torneira, naturalmente aberta, parecia implorar para ser fechada. Não esperei muito, talvez pela falta de paciência que só aumenta com o passar dos anos.

Pedi para que ela fechasse a bendita. "Ai, mas essa torneira é muito dura", foi o que escutei. Como não me falta força para girar uma reles torneirinha, fiz o 'serviço sujo' para a mocinha. Mal sabia eu o que me esperava...

Com o mais irritante escárnio, a bandida teve a ousadia de bradar: "Meu Deus, a água dos oceanos está secando, vamos salvar o mundo!". Sonoras gargalhadas das amiguinhas em BG. Apenas uma voz dissonante, baixinha e abafada, concordava com a minha atitude.

Confesso que saí do banheiro imediatamente. Em épocas outras, chamaria a colega para o 'caflito'. Mas o bom-senso, a gripe e uma (quase) maturidade advinda de duas gestações me acalmaram os ânimos.

Mas o desassossego, amigos, esse continua. Vai me acompanhar até apareça meu último fio de cabelo branco (só tenho um par até agora, juro, devidamente disfarçado). Tomara que, daqui para lá, ainda exista um pouco de água para lavar minha alma cansada de tanta ignorância.